Vivemos situação digna dos melhores livros de ficção científica.
O mundo paralisado por conta de um vírus letal, vindo da China.
Por conta disto, temos a economia paralisada nos grandes centros mundiais ocasionando prejuízos em todos os setores.
Não distante, o setor hoteleiro é um dos que mais acumula perdas com a pandemia do COVID-19.
Com a diminuição drástica do tráfego aéreo, não só companhias aéreas amargam prejuízos, mas também os hotéis, que dependem deste tráfego de pessoas.
Inúmeros eventos corporativos, congressos, pacotes turísticos, concursos públicos, precisaram ser suspensos ou cancelados, tendo em vista as medidas de isolamento, e suspensão das atividades econômicas em diversas cidades do Brasil.
Vale ressaltar que não só reservas presentes estão sendo canceladas, mas uma quantidade grande de reservas futuras também estão sendo canceladas, por conta da incerteza na duração do “lockdown”, cancelamento de eventos, entre outras medidas tomadas pelos governos Federal, Estadual e Municipal.
Segundo estudo realizado pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o setor de turismo no Brasil perdeu 2,2 bilhões de reais na primeira quinzena de março. O volume de receita diminuiu 16,7% em relação ao mesmo período no ano de 2019.
Nesta esteira, o Airbnb entre outros aplicativos de hospedagem, surgem como alternativa em casos extremos de necessidade de hospedagem temporária.
Ocorre que ainda é possível o tráfego de pessoas por estradas, portos marítimos e fluviais.
Assim, é possível que uma pessoa em deslocamento para outra cidade, por algum motivo urgente, necessite de hospedagem e não a encontre na rede hoteleira local.
Existem ainda os casos de pessoas que moram em hotéis, e que necessitaram buscar outro lugar às pressas para residir, dada a suspensão da prestação de serviço por alguns estabelecimentos de hotelaria e hospedagem.
Os aplicativos de hospedagem surgiriam como opção viável de hospedagem dado o momento crítico.
Tal solução se apresenta ainda mais convincente, quando considerado que o confinamento é medida necessária, tendo em vista diminuir a circulação de pessoas e coisas.
Assim sendo, nos casos de pessoas residentes em hotéis, teríamos apenas como solução imediata a locação por temporada (que teria o problema de visitação dos imóveis, inspeção e vistoria, negociação, garantia da locação), e o uso de aplicativos de hospedagem (que possui fotos disponíveis no aplicativo, pagamento via cartão de crédito, e negociação direta com o proprietário pelo próprio programa, minimizando, assim, o contato entre pessoas).
Ressalte-se ainda que o o Airbnb em sua página na Internet, informa a existência de um “programa Acomodações na Linha de Frente”, que consiste na iniciativa de o Airbnb buscar locais de hospedagem para profissionais de saúde, que sejam próximos aos hospitais, para que estes se isolem de suas famílias, diminuindo, assim, o risco de infecção dos familiares dos profissionais de saúde.
Importante afirmar que este programa não é gratuito, e que os “anfitriões” serão remunerados pela hospedagem fornecida, contudo, o Airbnb abre mão da cobrança de suas taxas de intermediação.
Em que pese o necessário uso da plataforma Airbnb em algumas situações, é importante ressaltar que os locais de hospedagem destes profissionais de saúde, contém outros moradores, e que podem não concordar com a vinda destas pessoas aos seus condomínios, o que aumentaria o risco de contágio entre os condôminos.
Desta forma, alguns condomínios que já proibiam seu uso anteriormente, possuem agora um motivo ainda maior para reforçar a medida adotada.
É inegável que os aplicativos de hospedagem aumentam a rotatividade de pessoas estranhas à vida do condomínio, aumentando, significativamente, a possibilidade de alguma pessoa infectada acessar as áreas do condomínio.
Contudo, não seria impossível que um morador do próprio condomínio contraia a doença na ida ao supermercado e também acesse as áreas do condomínio.
Assim sendo, muitos síndicos, acertadamente, suspenderam o acesso de condôminos às áreas comuns dos condomínios (academia, piscina, salão de festas, churrasqueiras, quiosques, quadras de esportes) para minimizar o contato físico entre condôminos, e a disseminação do vírus no ambiente condominial.
Tal medida reduz o risco, mas não o elimina, posto que o elevador é meio de transporte entre as unidades condominiais, havendo trânsito diário de grande quantidade de pessoas, não sendo impossível que algumas destas pessoas estejam infectadas e transmitam aos demais condôminos através do elevador.
Mas o questionamento que surge é: seria abusiva a proibição do uso de aplicativos de hospedagem por parte dos condomínios?
Ora, se analisarmos isoladamente o momento atual, ficamos seduzidos a adotar a tese de que tal medida é plenamente possível, bem como recomendável.
Sobretudo, por visar a diminuição do fluxo de pessoas e coisas nas dependências do condomínio, o que se não adotado, colocaria em risco os condôminos, possivelmente contendo neste grupo pessoas classificadas pela OMS (Organização Mundial de Saúde) como sendo do “grupo de risco” (idosos, portadores de doenças autoimunes, entre outros).
Noutro giro, se analisarmos a medida adotada pelos condomínios, pelo prisma jurídico, com foco no pleno exercício do direito de propriedade, tal medida seria abusiva, e completamente irregular, por não só violar o livre exercício do direito de propriedade pelos adquirentes de unidades nos respectivos condomínios (obviamente que dentro dos limites da lei), como também pode violar a convenção condominial e o regimento interno dos condomínios, que certamente não previram ocorrência de situação semelhante, e que possivelmente não contém proibição neste sentido.
Assim sendo, temos recomendado em nossos trabalhos sobre o tema COVID-19 e seus desdobramentos no setor imobiliário, é necessário haver uma conversão das vontades, envolvendo os condomínios e os proprietários, de modo a não só garantir a segurança e saúde dos residentes naquele condomínio, como garantir a saúde de toda a sociedade, minimizando os riscos de circulação de pessoas infectadas, diminuindo, assim, a chance de proliferação do vírus na sociedade.
Portanto, em um cenário ideal, seria recomendável que o proprietário da unidade solicitasse o teste do COVID-19 do locatário (hóspede), realizado em prazo próximo ao da entrega da unidade, e que fosse comunicado o síndico sobre a entrada do hóspede, fornecendo não só seus dados pessoais, bem como cópia do referido exame, orientando o locatário sobre os riscos e a necessidade de o mesmo se manter recluso pelo prazo orientado pelas autoridades.
Ademais, é recomendável o reforço no cuidado dos funcionários do condomínio com a chegada do novo residente, aumentando a limpeza do elevador e do hall de entrada da unidade do hóspede nos primeiros dias de sua chegada, levando em consideração que o mesmo ficará isolado pelo prazo recomendado.
Posteriormente ao isolamento recomendado, descartando o risco de o novo morador estar infectado e a desconfiança com o novo residente, sua estadia no condomínio seria como a de qualquer condômino, resguardado o exercício de seus direitos enquanto pessoa humana e locatário.
Desta forma, concluímos que é possível a adequação e uso dos aplicativos de hospedagem ainda que em período de pandemia, desde que observados cuidados de segurança, saúde e higiene por parte não só do hóspede, mas também do proprietário da unidade locada (anfitrião) e do síndico do condomínio.
REFERÊNCIAS:
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DEARO, Guilherme. Hotéis pelo Brasil fecham durante pandemia do novo coronavírus. Disponível em: https://exame.abril.com.br/estilo-de-vida/hoteis-pelo-brasil-fecham-durante-pandemia-do-novo-coronavirus/ Acesso em 25/04/2020.
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PEREIRA, Vitor de Arruda. Hoteleiros de Porto Alegre apresentam medidas ao prefeito para salvar o setor. Disponível em: https://agoranors.com/2020/04/hoteleiros-de-porto-alegre/ . Acesso em 25/04/2020.
SAMPAIO, Lucas Rafael. O pagamento de aluguéis na ocorrência de COVID-19. Caminhos seguidos por alguns países. Disponível em: https://lucasrasampaio.jusbrasil.com.br/artigos/828114202/o-pagamento-de-alugueis-na-ocorrencia-de-covid-19-caminhos-seguidos-por-alguns-paises. Acesso em 25/04/2020.
SAMPAIO, Lucas Rafael. A administração dos condomínios em tempos de Coronavírus (COVID-19): (parte 1) Interdição de áreas comuns. Disponível em: https://lucasrasampaio.jusbrasil.com.br/artigos/826203778/a-administracao-dos-condominios-em-tempos-de-coronavirus-covid-19-parte-1-interdicao-de-areas-comuns . Acesso em 25/04/2020
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